Nova pesquisa revela uma ampla migração de microplásticos de embalagens de alimentos e utensílios para as nossas refeições, exigindo regulamentações de segurança atualizadas e métodos de teste harmonizados.
Será que os plásticos usados para proteger nossos alimentos estão se tornando parte deles? Um estudo inovador recentemente publicado na npj Science of Food lança nova luz sobre a migração de partículas de plástico de artigos de contato com alimentos (FCAs) - como embalagens, utensílios e equipamentos de processamento - para nossos alimentos.
Os pesquisadores desenvolveram um mapa sistemático de evidências (SEM) para avaliar a extensão desse problema, compilando dados de 103 estudos revisados por pares que documentaram mais de 600 casos de micro-, nano- e mesoplásticos (MNPs) migrando para alimentos ou simulantes. Os resultados? Mais de 96% das entradas detectaram partículas de plástico, com 75% envolvendo itens de uso único, como copos, recipientes e especialmente saquinhos de chá.
Os saquinhos de chá foram um dos itens mais examinados, especialmente aqueles feitos de plástico ou selados com adesivos plásticos. Altas temperaturas durante o preparo parecem agravar a liberação de plástico. Tábuas de corte de plástico, tampas de garrafa e recipientes também liberam MNPs durante o uso rotineiro, como cortar ou desenroscar as tampas.
“A migração de partículas de plástico não é apenas uma possibilidade - é uma realidade documentada”, enfatizam os autores. “Mas o cenário regulatório ainda não acompanhou.”
O SEM destacou uma lacuna regulatória: enquanto o Regulamento (CE) nº 1935/2004 da Comissão Europeia aborda a migração química, ele não cobre explicitamente partículas de plástico como microplásticos. Essa lacuna regulatória pode significar que uma exposição significativa ao plástico está passando despercebida.
Curiosamente, até mesmo materiais não plásticos, como frascos de vidro e latas de metal, não foram isentos de escrutínio. Estudos assumiram que esses itens continham MNPs devido a revestimentos ou selos plásticos. Isso amplia as fontes potenciais de ingestão, indicando que a liberação de plástico não é exclusiva de produtos visivelmente plásticos.
Embora a pesquisa tenha identificado 600 entradas, apenas 50 foram consideradas “altamente confiáveis”. Esses estudos relacionaram diretamente MNPs a FCAs em condições do mundo real, como altas temperaturas ou uso repetido. Ainda assim, a grande maioria dos materiais de embalagem de alimentos e polímeros permanecem insuficientemente estudados, o que representa desafios para comparações entre estudos e generalização.
De particular preocupação é a inclusão de plásticos biodegradáveis como PLA, que alguns estudos sugerem que podem liberar ainda mais MNPs do que plásticos convencionais. Embora isso possa minar a credibilidade ambiental das embalagens compostáveis, os autores enfatizam a necessidade de pesquisas mais rigorosas antes de tirar conclusões definitivas.
Os impactos potenciais na saúde da ingestão de MNPs ainda estão sendo avaliados. No entanto, pesquisas iniciais relacionaram altas concentrações de MNPs a distúrbios imunológicos, estresse oxidativo, neurotoxicidade e problemas reprodutivos - principalmente em modelos de roedores. A tradução desses efeitos para humanos ainda é incerta, mas o princípio da precaução sugere que minimizar a exposição é prudente.
Para melhorar a transparência e o engajamento público, os pesquisadores lançaram um painel de acesso aberto - FCMiNo - permitindo que os usuários explorem todas as 600 entradas documentadas com base no tipo de alimento, material de embalagem e tipo de polímero. Essa ferramenta serve como recurso educacional e auxílio à pesquisa, permitindo que reguladores, cientistas e consumidores avaliem áreas de risco e lacunas de conhecimento.
As conclusões do estudo são claras:
- Partículas de plástico migram para alimentos em condições de uso típicas.
- As regulamentações atuais não abordam adequadamente essa forma de contaminação.
- Protocolos de teste padronizados e rotulagem clara dos materiais são urgentemente necessários.
Em uma era de aumento do consumo de alimentos ultraprocessados e embalados, a presença de MNPs nas refeições diárias é uma preocupação invisível, mas potencialmente significativa para a saúde. Os autores pedem atualizações urgentes nas regulamentações de segurança alimentar para incluir a migração de MNPs como um critério de teste crítico e recomendam metodologias harmonizadas para garantir resultados consistentes e replicáveis em toda a indústria.
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